THEÓFILO SILVA
Na corrupta Viena da peça Medida por Medida, de Shakespeare, palco de uma das grandes reflexões sobre o Direito na Literatura, é o próprio Juiz Ângelo quem diz: “Os ladrões têm perfeitamente o direito de roubar, quando os próprios juízes roubam”!
Aproveito esse pensamento do Bardo para perguntar. O que deve uma sociedade fazer quando seus juízes nos roubam à paciência?
Temos hoje uma clara insatisfação com a corte suprema do Brasil. As várias operações policiais, em que se prenderam dezenas de ladrões do dinheiro do Estado, são um prova disso, porque imediatamente o STF libertou os sujeitos e, ao ser indagado pela Imprensa, o juiz-presidente deu suas respostas num palavrório impostado e arrogante atacando o Ministério Público. Quanto aos policiais federais, foram chamados de “canalhas”, e os acusados não foram presos nem condenados. É de conhecimento da nação que, nos últimos quarenta anos, o STF não condenou ninguém.
Não satisfeito, o atual juiz-presidente adotou um comportamento esquisito: dá risadas na cara de um colega, ameaça jornalistas, proíbe o uso de algemas em presos, virou empresário, faz declarações o tempo todo. Resultado: conseguiu levar manifestações populares à porta do Tribunal; virou motivo de chacota em todo o país, ao ponto de misturarem seu nome com o de um notório freqüentador de páginas policiais a quem ele concedeu dois habeas corpus. Em virtude do personalismo de seu presidente - pretendendo proteger a instituição - o decano da Casa organizou uma espécie de ato de desagravo a esse juiz.
Existe uma certa mística em torno de um juiz do STF a qual não encontra respaldo no resto da sociedade, sendo restrita, ao mundo do Direito. O correto mesmo é que esses juízes estejam distantes do povo, porém próximos de seus anseios. No entanto…
No entanto, no tocante às Leis, estamos iguais à Viena do juiz Ângelo: “A cidade tem leis para todas as faltas, porém, essas faltas se acham de tal maneira protegidas que os mais fortes estatutos são semelhantes às proibições penduradas numa barbearia: são lidas mas ninguém se importa com elas”. Os corruptos estão se lixando para as nossas leis.
A impunidade gera um problema seriíssimo que grande parte da sociedade, infelizmente, não consegue ver. Diferentemente do que afirma o atual presidente do STF, não é “o homem da esquina” que está preocupado com essa questão. É todo o país que está discutindo isso.
Se nos EUA a Suprema Corte – da qual a nossa copiou o modelo – é algo sagrado, e os juízes são somente juízes e não dão opiniões em público, aqui o juiz-presidente é empresário e outros juízes trabalham pra ele. Os americanos estão plenamente satisfeitos com sua corte superior de justiça, nós não. Ninguém entende por que um juiz do STF não acha elementos para condenar alguns notórios criminosos que há dezenas de anos assustam e desmoralizam a justiça brasileira; sinceramente não dá pra entender. Daí que o país já começou a falar em impeachment de um membro do Supremo Tribunal Federal. O STF subtraiu a paciência do país.
Apavorado com a corrupção em Viena, o Duque declara: “Não façamos da lei um espantalho, usando-o logo de início para espantar as aves de rapina, deixando-o, depois, imóvel. Até que o hábito faça dele seu poleiro e não objeto de seu terror”. Triste Viena em que a justiça não passa de um espantalho.
Só posso me lembrar da injustiçada Isabela, de Viena: “A quem me queixarei? Quem me acreditaria, se contasse isto”? E conclui: “Oh! Perigosas bocas que só têm língua, a mesma para condenar e a mesma para absolver! Forçam a lei para que se incline diante de seus caprichos; pregam o justo ou o injusto com a isca de seu apetite”. Pobre Viena!
Theófilo Silva é presidente da Sociedade Shakespeare de Brasília e colaborador da Rádio do Moreno
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