Lula é mal-agradecido
Há um fato inegável que a direita não consegue entender de jeito nenhum: o Brasil tem cerca de 200 milhões de habitantes e as torcidas políticas petista e tucano-pefelista não devem responder nem pela centésima parte da população. Os outros 99% ficam só olhando e procurando onde está a razão, em boa parte achando que ela não está em lado nenhum.
É claro que o percentual acima é um chute, mas estou certo de que tanto direitistas quanto esquerdistas concordam que a grande, que a esmagadora maioria dos brasileiros não está nem aí com a política e não torce para ninguém, e que está preocupada apenas com o que a classe política pode fazer por ela, por mais que, no varejo, essa maioria se engane elegendo verdadeiros meliantes. Mas, no atacado, ou seja, num cargo como o de presidente, a coisa é bem diferente.
O fenômeno Lula, o fenômeno de ele ser o presidente mais popular da história brasileira – e já dou um aviso aos direitistas: nem a mídia nem a oposição tucano-pefelista negam isso –, reside, em grande parte, na boa situação econômica do país, mas, a meu juízo, a direita e seus jornais e tevês ajudam muito o presidente por fazerem dele uma legítima vítima de mentiras e distorções dos fatos que só um cego pelo partidarismo não vê.
O governo Lula está muito longe de ter feito o suficiente pela situação social escabrosa de uma parte enorme da população brasileira e contra os abusos históricos do topo da pirâmide social. Num ambiente de normalidade política, em minha opinião o presidente e seu governo seriam muito mais cobrados do que são. E nem seriam tão populares.
Só para ficarmos em dois exemplos frugais: os banqueiros ganham no Brasil o que não os deixam ganhar em parte nenhuma do mundo. Já uma pesquisa publicada hoje na Folha de São Paulo mostra que a telefonia brasileira é uma das mais caras do mundo mesmo estando longe de ser uma das melhores.
Enfim, há muito que cobrar deste governo.
Para Lula, portanto, o melhor cenário possível é aquele em que ele e seu governo se tornam vítimas de preconceito e de acusações claramente infundadas, porque a quase totalidade dos brasileiros olha a cena política com olhos de ver, ou seja, sem o véu do partidarismo, até porque o brasileiro, para o bem ou para o mal, é um dos povos mais despolitizados do mundo.
Há uma constelação de ataques injustos que a grande mídia e a oposição vêm fazendo a Lula desde que ele entrou na política. No começo, esses ataques colaram. Demorou quase duas décadas para que ficasse completamente claro como a mentira e o preconceito são as principais armas que a direita usa contra o petista.
Em 1989, aquela parcela mais volúvel da opinião pública comprou os ataques que fez na tevê a ex-namorada de Lula Miriam Cordeiro, paga por Fernando Collor para atacar seu ex às vésperas do segundo turno da eleição presidencial. E essa parcela também comprou a teoria collorido-midiática de que Lula confiscaria a poupança se fosse eleito.
Resultado: tornou-se público, depois, que Collor sustentou Miriam vivendo em um hotel por anos a fio em pagamento aos serviços prestados. E quem confiscou a poupança acabou sendo aquele que afirmou que Lula é que faria isso.
Ainda assim, a doutrinação da mídia e as mentiras de mais um adversário de Lula, FHC, aliadas ao Plano Real, derrotaram o petista em 1994 e derrotariam de novo em 1998, quando o tucano, a exemplo de Collor, vendeu à população que se Lula se elegesse ele é que desvalorizaria o real, quando o mundo inteiro sabia que a desvalorização era questão de tempo e tanto Lula quanto FHC teriam que fazê-la se ganhassem a eleição.
O país pagou um preço exorbitante por acreditar novamente na mídia e na direita. Em janeiro de 1999, semanas depois de FHC vencer a eleição presidencial dizendo que Lula desvalorizaria o real, quem o fez foi o tucano, o que pôs o país em grave recessão, gerando desemprego, concentração de renda e endividando o país em 40 bilhões de dólares. E depois ainda veio o Apagão.
Foi a gota d’água para a grande maioria. Estava claro que a mídia não queria Lula na Presidência e que se aliava sempre aos seus adversários. E que, sempre que acreditava na mídia, o brasileiro se dava mal. Foi isso que elegeu Lula em 2002.
Mas foi durante o governo Lula que seu titular se impermeabilizou contra críticas de uma forma que poderia ter feito dele um déspota se não se tratasse de um verdadeiro democrata e se o presidencialismo à brasileira não tornasse frágeis os chefes de Estado e de governo. Tudo aquilo de que acusaram o presidente e seu governo continuou não se confirmando.
Disseram que o Bolsa Família era uma ficção. Passados alguns anos, o programa deu enorme contribuição, entre outros fatores, para o Brasil deixar de ser um país de pobres para se tornar um país em que a maioria ascendeu à classe média, segundo o IBGE.
Disseram que a economia não cresceria e que empregos não seriam gerados, e, pelo menos até uns três meses atrás, o país cresceu e gerou empregos como nunca.
Só para não me alongar demais neste texto, que ainda tenho que escrever o Manifesto do ato público do próximo sábado, economizarei nos exemplos.
Inventaram epidemia de febre amarela e depois se constatou que não existia epidemia nenhuma. Inventaram que a inflação tinha voltado e ela não voltou. Inventaram escândalos como mensalão, dossiês etc, e depois nada disso se confirmou, por mais que a mídia e a oposição tentem transformar em fato o que nunca passou de teoria.
Outro fator que fortaleceu Lula: mídia, PSDB e PFL passaram a insultar a população por não lhes comprar as teorias anti-Lula. Xingaram os beneficiários do Bolsa Família de vagabundos e parasitas para baixo. Xingaram a maioria dos eleitores de Lula de estúpidos e desinformados. E por aí vai.
E as picuinhas midiático-oposicionistas arremataram o descrédito em que a direita mergulhou. As últimas foram desrespeitar a mulher de Lula nos jornais porque ela se misturou com o povo no Sambódromo carioca durante o Carnaval e inventarem que o presidente só não foi vaiado ali porque “se escondeu”, enquanto José Serra e Gilberto Kassab eram copiosamente vaiados no Sambódromo paulistano.
Agora, porém, a mídia e a oposição se enterraram de vez com essa história dos boxeadores cubanos. Divulgaram à exaustão que Lula os tinha deportado para Cuba. Deram crédito à versão deles nesse sentido. Depois, eles voltam atrás e daí a mídia não acredita. Novamente eles retomam a versão da deportação e a mídia a compra e defende. Finalmente, voltam atrás de novo e a mídia volta a não acreditar neles. E acha que ninguém nota.
Freqüentemente, a empulhação tucano-pefelê-midiática mais espantosa de todas, a versão insana de que a mídia é pró-Lula, é usada. Pois saibam que já começo a dar crédito a essa versão, mas não da forma como a direita quer. Não posso negar que quem construiu essa blindagem em torno de Lula e de seu governo, foi a mídia.
E a construção é sólida. Vejam que maluquice: todas as pesquisas de opinião mostram que Lula tem uma popularidade esmagadora em todas as classes sociais, em todos os níveis de instrução, em todas as regiões do país e em todas as faixas etárias. Com pesquisas e tudo, a mídia e a oposição continuam dizendo que só quem apóia Lula são os miseráveis que ele “compra” com o Bolsa Família.
Com uma oposição dessas, até eu me torno quase uma unanimidade. Lula deveria amar a mídia. Quando ele a critica, está sendo muito mal-agradecido a ela e aos seus proprietários tucano-pefelês.
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