Brasil alvoroça ordem mundial, diz 'El País'.
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai à Assembleia da ONU 'com autoridade de quem chega com os deveres feitos'.
- O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chega a Nova York para participar da abertura da Assembleia Geral da Onu em situação "que não poderia estar melhor", segundo reportagem publicada nesta terça-feira pelo diário espanhol El País. Lula deve pedir reformas nas instituições financeiras internacionais, um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU e deve defender a intervenção do Estado na economia para evitar excessos financeiros, diz o jornal. Lula "falará com a autoridade de quem chega com os deveres de casa muito bem feitos", afirma a reportagem, destacando que a crise financeira "não passa de uma lembrança no Brasil". "O Brasil se recuperou com rapidez e dinamismo e provavelmente vai fechar o ano com crescimento bastante superior ao do resto dos países membros do G20." O presidente também deve pedir aos 192 países participantes da Assembleia Geral que não baixem a guarda diante da recente recuperação econômica e coloquem em prática as medidas anticrise que vêm sendo discutidas desde a cúpula do G20 em Washington, em novembro passado. "Quando a crise mundial alcançou seu ápice, o Brasil anunciou um empréstimo ao FMI no valor de US$ 10 bilhões e, desta maneira, passou a formar parte do seleto grupo de sócios doadores da instituição", diz o jornal. O jornal diz que Brasília considera a estrutura de órgãos como o Banco Mundial e o FMI está hoje totalmente obsoleta e não é representativa dos países emergentes. "Desta maneira, o Brasil enfrenta uma semana de ofensiva diplomática para consolidar sua condição de líder regional sul-americano e novo ator de transcendência no panorama internacional." O Brasil, "que há anos assume o papel de porta-voz oficioso dos países em vias de desenvolvimento", também deverá reclamar um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, "orgão onde se tomam as verdadeiras decisões", diz o jornal. Para o Brasil, o assento seria uma forma de fazer com que os interesses do Terceiro Mundo sejam levados em conta "verdadeiramente". Como argumento, o país conta com a indiscutível liderança na América do Sul, "esta supremacia se assenta em uma sólida economia que, segundo os analistas, já representa 57% do capital sul-americano".
Honduras: o Papel do Brasil e o papel da mídia golpista, de lá e de cá
Honduras voltou a chamar atenção da mídia internacional. E por uma razão. Zelaya regressou ao país e agora se encontra na embaixada brasileira de Tegucigalpa, capital. O que ocorre hoje em Honduras é, de longe, o fato político e geopolítico mais importante nas Américas. Todos os elementos que caracterizam as lutas políticas nos países latino-americanos encontram-se em Honduras em estado bruto e radicalizado. Imprensa e elite associadas, mafiosamente, em atitude golpista. Povo acuado e desorganizado, de outro. Políticos no meio, ao sabor do vento. Um presidente sendo empurrado cada vez mais para a esquerda. A história é uma mulher triste e chorando, mas sempre linda. O golpe em Honduras desmoralizou a direita, e pôs em cheque a honestidade da Sociedade Interamericana de Imprensa e demais organizações sindicais midiáticas do continente. O que a imprensa fez e está fazendo em Honduras é tortura psicológica inconcebível. Acompanho, no RSS aí do lado, dois blogs hondurenhos, de luta antigolpista, os quais também estão no Twitter, e o protesto principal que vejo por lá é a desonestidade sem limite da mídia nacional, que procura distorcer absolutamente tudo que acontece no país.
Como é um país pobre, com baixo uso de internet, a influência da mídia convencional é muito forte. A mídia hondurenha criou uma realidade virtual, com apoio dos intelectuais midiáticos (as mesmas repugnantes espécies que temos por aqui), que justificam o golpe juridica e politicamente. Uma das coisas que realmente me impressionam foi a maneira repentina e inexplicável como Honduras sumiu da pauta midiática brasileira por várias semanas. Depois da cobertura dos primeiros dias, a mídia iniciou uma cobertura cada vez mais hesitante. Ontem, ouvi o Boris Casoy falar em governo "de fato" em Honduras, substituindo o termo que havia se generalizado antes, "governo golpista". A verdade é que houve uma campanha da extrema-direita no Brasil, liderada por Reinaldo Azevedo, editorialista da revista Veja, para que a cobertura do golpe em Honduras fosse radicalmente modificada. Como não podia inverter a posição editorial que, embora hesitantemente e pressionada pela reação internacional, havia assumido de início, a mídia brasileira optou pelo silêncio sepulcral. Semanas e semanas sem uma linha, uma notinha, uma palavra sequer sobre Honduras. Agora, repito, o fato político impõe-se, derrubando o pacto de silêncio, porque o Brasil abrigou Zelaya na embaixada brasileira. Reações negativas midiáticas começam a pipocar, como a entrevista com o embaixador Rubens Barbosa, que é incompetente (patrocinou o plano de retenção de café em 2001, que deu prejuízo superior a 400 milhões de dólares ao Brasil), invejoso e colonizado, quase afirmando que o Zelaya deveria estar na embaixada americana e não na brasileira; e o Estadão dando manchete alarmista sobre os riscos de "fratura social" que a volta de Zelaya traz ao país.
Pesquisadores, historiadores, jornalistas, cientistas políticos, ativistas, parlamentares, cidadãos, observem atentamente o que acontece em Honduras. O destino da democracia da América Latina reside neste pequeno e sofrido país centro-americano. O golpe vai fracassar, disso eu tenho certeza. O que devemos observar é todo o contexto político, a reação das mídias latinas ao pós-golpe. Depois que Zelaya retornar ao poder, deverá ocorrer, uma hora ou outra, um julgamento interno sobre os responsáveis por esse tenebroso atentado contra o espírito democrático das Américas. É muito pior que qualquer atentado terrorista, porque mexe com nossos traumas mais profundos. Milhões de latino-americanos que sofreram, na pele, as consequências nefastas de ditaduras militares, seguramente sentiram um horrível frio na espinha quando chegaram notícias de Tegucigalpa. Esse progressismo latino, forjado nas lutas sangrentas anti-totalitárias, revelou-se na condenação veemente e absoluta, pela classe política de todo o continente. O golpe em Honduras pendurou-se, então, no apoio midiático interno, no silêncio dos sindicatos internacionais de imprensa, além da participação histérica de figuras isoladas, mas barulhentas, da extrema-direita no continente, do Brasil aos Estados Unidos.
Um leitor pediu-me que falasse alguma coisa sobre a entrevista de Ciro Gomes à rede Bandeirantes, no último domingo. Pois é, por coincidência, eu assisti. Tenho a dizer o seguinte: valeu Ciro! A entrevista lavou-me a alma. Assisti-a pontuando de palmas e gritos de entusiasmo. Ciro Gomes não fugiu de nenhum tema político. Ao contrário, trouxe-os à baila: Chávez, corrupção, mensalão, Lula, mídia, golpismo midiático, golpismo de setores da elite. Não gaguejou uma vez. Não tergiversou. Mais uma vez cito aquela moça triste, sempre chorando, e contudo tão absurdamente linda, a História. O radicalismo midiático produziu um fenômeno interessante: a esquerda brasileira, mesmo estando no poder, tem à sua disposição um eficaz e necessário discurso de oposição. Isso é ótimo, porque a esquerda pode bater em seus adversários por todos os lados. Bate no Congresso, onde tem maioria; bate no Executivo, onde tem o controle, através de Lula, Dilma Roussef e Tarso Genro; e bate na mídia, através do debate político que começa a esquentar agora; e o melhor, bate aqui na blogosfera, onde nossa diversão, nos últimos anos, não tem sido outra. Eu quero mais é que a direita se dane. A direita já matou e torturou centenas de milhões de latino-americanos desde o início da colonização. Quando analisamos a história das civilizações, observamos que sempre houve uma dialética política. Roma antiga experimentou lutas acirradas entre as forças populares e conservadoras, e ambas obtiveram vitórias memoráveis. Roma não apenas a sociedade dos patrícios e dos escravos, foi também onde os plebeus exerceram o poder através de seus tribunos sagrados. Os plebeus romanos experimentaram diversos momentos emocionantes de vitória, com Mario, com os irmãos Graco e, enfim, com Júlio César. Da Grécia, então, nem se fala, porque foi uma civilização notoriamente de esquerda, democrática, em oposição à Ásia conservadora, mística e totalitária. Na Europa, tivemos a revolução francesa e as repercussões ideológicas que até hoje se observam em todo o continente. Nos EUA, a revolução americana da independência, um movimento de cunho fortemente progressista e, sobretudo, presidentes como Roosevelt, além da própria continuidade democrática, que permitiu à cultura se organizar de maneira que o cinema e a literatura norte-americanos desenvolveram uma sólida musculatura ideológica, com capacidade de resistir e combater os governos mais odiosamente conservadores.Enfim, a América Latina precisa aprender a praticar o debate ideológico com a ferocidade e a determinação que ele merece, por constituir a base da civilização e da cultura. No Brasil, o processo de Anistia não pode significar a distorção da História. Nossas crianças e adolescentes devem saber que forças apoiaram o golpe de Estado de 1964, e quais foram os métodos usados: moralismo hipócrita, mentira sistemática, terrorismo ideológico, denúncias de corrupção seletivas. Por exemplo, o golpe militar foi patrocinado com desvio de recursos públicos do Adhemar de Barros, governador de São Paulo. Esses desvios não eram denunciados pela imprensa nacional, que focava suas denúncias na esquerda, como faz até hoje. Todos os assuntos abordados no post de hoje foram abordados na entrevista de Ciro Gomes à Bandeirantes, e por aí podemos ver como um debate político franco e corajoso será útil para esclarecer a nação brasileira sobre sua história e seu destino. A participação de Ciro na campanha eleitoral de 2010, seja na presidencial, seja para o Estado de São Paulo, será valiosa, porque ele sentiu de onde vem o cheiro ruim que infesta a política nacional e tem a coragem de dar nome aos bois. Sua presença é particularmente importante em função da atitude frágil de Marina Silva. A força de Ciro Gomes, pode-se notar, é física, concreta. Para enfrentar os setores golpistas da imprensa e da elite, precisa-se de uma coragem física. É triste que tantos parlamentares do PT, por exemplo, deixem tanto a desejar nesse quesito; mesmo apanhando feio no lombo não se resolvem a assumir uma postura mais combativa e orgulhosa, que é o que os brasileiros desejam. Sempre que um parlamentar abaixa a cabeça para a mídia no debate político, os milhões de brasileiros que não querem a volta da direita ao poder, e intuem, com razão, que a vitória, ou derrota, se contrói nessas pequenas lutas cotidianas, sentem-se impotentes, humilhados e, por fim, revoltados e indignados. A humilhação, convertida em revolta, torna-se uma força. A mídia anseia continuamente em produzir um exército de indignados, mas é frustrada pela ação política concreta do governo Lula, de um lado, e pela argumentação ideológica inovadora produzida na internet, de outro.
Registro também que setores importantes da Academia e da classe artística estão antenados na crescente polarização entre as forças políticas do continente americano, com uma mídia corporativa inclinando-se cada vez mais para uma postura reacionária e neoliberal, e classes políticas, pressionadas pelo voto popular, indo para o lado oposto, para ampliação do papel do Estado, adotando políticas públicas de redistribuição de renda. Debate ocorrido no Centro Cultural Banco do Brasil no último final de semana falou sobre a nova lei de mídia da Argentina. Em todo continente, começa-se a discutir novos marcos regulatórios para a imprensa. Essa é a razão de ser da democracia: um regime político dinâmico, com parlamentares eleitos pelo povo para estarem sempre atualizando as leis aos novos tempos, às novas forças sociais que emergem. A liberdade não pertence aos proprietário de meios de comunicação. A liberdade, assim como o poder, pertence ao povo. E quando falo em povo, não refiro-me à massa ignara, e sim ao povo compreendido diacronicamente, ou seja, o povo na história, organizado, com suas vanguardas intelectuais e artísticas. O futuro da humanidade é a união dos povos. É a criação de uma moeda única. É ser governada por organizações internacionais centralizadas, democráticas, que garantam a liberdade das nações e dos indivíduos. Mas isso é outra história. Por enquanto, o destino do mundo reside em Honduras. Prestemos atenção.
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