Eduardo Guimarães na Folha de São Paulo (reduto do PIG)
Blog Cidadania
Alameda Barão de Limeira, centro de São Paulo, pontualmente às 15:20 hs de 20 de maio de 2008. Aproximei-me do balcão da portaria do Jornal Folha de São Paulo, dei meu nome à recepcionista, dizendo que tinha uma reunião com o ombudsman do jornal, Carlos Eduardo Lins da Silva. Fui anunciado por telefone e, em seguida, recebi um crachá e fui convidado a subir ao 8º andar do prédio, sem mais delongas.
O escritório do ombudsman é espartano, bem como os corredores da Folha, como convém a um veículo que se diz "a serviço do Brasil". Lins da Silva é muito simpático. Fala pausadamente, em tom de voz moderado e é um excelente ouvinte.
Optei por iniciar nossa reunião fazendo a ele uma exposição sobre quem era eu e quais eram meus motivos para estar ali. Falei do Movimento dos Sem Mídia, da manifestação do MSM diante da Folha no ano passado, da qual ele disse nunca ter tomado conhecimento, e falei, também, da representação que a ONG fez ao Ministério Público Federal. Finalmente, manifestei as críticas e indagações dos leitores deste blog e minha visão sobre a Folha e o resto da grande imprensa. Fui ouvido atentamente.
Por conta da honestidade intelectual que tanto prezo, sou obrigado a reconhecer que, apesar de várias teorias conspiratórias que surgiram, e as quais eu mesmo cheguei a considerar, não acredito que o convite que recebi de Lins da Silva tenha tido qualquer outra motivação além da que ele alegou.
Devido ao fato de que sou amador em termos de jornalismo, levei para a entrevista um pré-histórico gravador de fita cassete que pedi emprestado. O aparelho, arcaico, gravou em volume extremamente baixo nossa conversa, o que me gerou grande trabalho para fazer sua transcrição. Daí a demora em sair este post.
Reproduzo, a seguir, textualmente, a explicação que Lins da Silva me deu para a razão de seu convite. Antes, porém, explico que essa razão já me tinha sido explicada em e-mail que recebi dele há algumas semanas. Essa razão teria sido crítica que lhe fiz sobre sua atuação como mediador do programa Roda Viva, da TV Cultura, durante uma entrevista concedida pelo ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim.
Eis a explicação do ombudsman:
"Eu o convidei, primeiro, porque eu queria que você me mostrasse onde eu tinha sido parcial na condução da entrevista [com o ministro Celso Amorim] e também por ver uma possibilidade de diálogo que poderia ser enriquecedora para mim e, quem sabe, para você. A fita da entrevista está aqui [entregou-me a fita em DVD] e gostaria que você me apontasse onde eu fui parcial contra o ministro. Eu acho que eu não cometi isso. Eu conheço o ministro há muitos anos, temos uma excelente relação e dias antes, 72 horas antes do programa, ele estava em Washington, ele não tinha que estar em São Paulo aquele dia, ele veio especialmente para o programa. Eu acho, pela reação do ministro e de seus assessores ao fim do programa, que eu não fui parcial, que eu não fui antagônico ao ministro. Todo jornalista tem que ser duro nas perguntas com qualquer entrevistado, porque senão vira assessoria de imprensa, não é jornalismo. Eu acho que fiz algumas perguntas duras, mas eu acho que tentei manter a imparcialidade e coibi alguns ataques que eu achei que eram excessivos, que não deixavam que ele completasse seu raciocínio. Por isso, eu gostaria que você me mostrasse onde foi que eu errei e, se eu me convencesse, se eu vier a me convencer de que eu errei, vou pedir desculpas ao ministro e eu vou rever aquilo que eu fiz. De resto, sobre as observações que você me fez aqui, até agora, eu tenho muitos pontos de concordância e outros dos quais eu discordo. Agora, eu só queria deixar claro para você a minha disposição de ouvir, a minha disposição de pensar. Não sou petista, não sou antipetista, não sou de partido, como você também não é".
Como eu disse anteriormente, a impressão que tive da mediação de Lins da Silva naquele Roda Viva foi a de que ele não coibiu adequadamente as tentativas dos jornalistas ali presentes de impedirem Amorim de se manifestar com tranqüilidade. Não fosse assim, as interrupções, as tentativas de cassar a palavra do ministro, não teriam prosseguido até o último minuto do programa. Entretanto, por desencargo de consciência, obrigo-me a assistir ao DVD que Lins da Silva me entregou, a fim de especificar melhor minhas críticas à sua atuação como mediador daquele programa.
Após a explicação do ombudsman sobre o convite que me fez e sobre qual acredita ter sido sua postura no tal programa, entreguei a ele os comentários dos leitores deste blog e pedi que concedesse uma entrevista ao Cidadania.com, no que fui prontamente atendido. Abaixo, segue nossa conversa. Por enquanto, limitar-me-ei a reproduzir a entrevista. Os comentários sobre as opiniões de Lins da Silva, por enquanto deixo para vocês. Depois, em outro post, farei os meus comentários.
Eis a entrevista que gravei hoje com o ombudsman da Folha de São Paulo.
Cidadania - Eu gostaria de lhe fazer uma pergunta sobre a sua coluna do último domingo. É sobre a Ponte Estaiada, sobre a resposta dada pela redação da Folha de São Paulo sobre sua mudança de posição aparente em relação à obra, porque, em 2005, sobre a obra licitada pela prefeita Marta Suplicy, a Folha a considerou cara e supérflua. Hoje, a administração Gilberto Kassab deu à ponte o nome do patrono do jornal, o sr. Otávio Frias de Oliveira, e a Folha fez uma "belíssima" cobertura, com gráficos, falou sobre a solenidade, com a presença de parentes do sr. Frias, tudo muito bem, fez uma reportagem extensa, com explicações sobre tudo, mas, apesar de você dizer na sua coluna do último domingo que a Folha mantém sua opinião, e que seria descortês ela...
Lins da Silva - Eu não disse, a Folha disse.
Cidadania - Então, a Folha disse... A Folha alega que mantém a sua opinião sobre a obra, mas que não iria fazer uma desfeita ao poder público. Na verdade, esse "poder público" é um grupo político...
Lins da Silva - Não foi isso que disse a Folha, também.
Cidadania - Então vamos ver aqui, na sua coluna de domingo...
Lins da Silva - A Folha não disse que não iria fazer uma desfeita ao poder público. A Folha disse que o poder público iria fazer uma homenagem ao sr. Frias e que não seria o caso de não aceitar a homenagem.
Cidadania - O que você escreveu, Carlos Eduardo, foi o seguinte: "Seria descabido que a Folha e a família Frias rejeitassem uma homenagem ao seu líder". Essas são suas palavras textuais.
Lins da Silva - Minhas, não, da Folha.
Cidadania - Sim, da Folha, conforme você relatou. A explicação da redação, não é isso? Mas, enfim, é o seguinte: não seria o momento para que a Folha reafirmasse suas críticas à ponte na reportagem?
Lins da Silva - Sim, e você sabe que eu disse isso na coluna de domingo. Minha opinião é a de que a Folha deveria, na reportagem, ter feito a mesma observação [contra a ponte] que ela fez anteriormente [em 2005, quando o jornal elogiou a decisão de Serra de suspender a obra, apesar de que ela foi retomada e concluída].
Cidadania - Então você considera que realmente a Folha omitiu [na reportagem sobre a inauguração da ponte Estaiada] essa postura dela pretérita e não deveria ter feito isso.
Lins da Silva - Não, não deveria ter feito isso.
Cidadania - Você tem alguma idéia do por que a Folha fez isso?
Lins da Silva - Não, não tenho. Eu disse, em minha coluna, que a Folha recebeu 23 questionamentos [de leitores]. Mas a Folha não escreveu nenhum editorial dizendo que a ponte é boa, que a ponte foi barata, mas eu acho que a Folha deveria ter colocado na reportagem uma nota dizendo que continua achando que a ponte é supérflua e cara.
Cidadania - Você concorda com a premissa de que se a ponte é supérflua e cara, é uma obra ruim para São Paulo?
Lins da Silva - Não necessariamente. Duas coisas: primeiro, a ponte está pronta. Eu não estou falando em nome da Folha, é minha opinião pessoal. Não teria cabimento pedir que se derrubasse a ponte. Segundo, eu acho que, em princípio, se ela é supérflua e cara, ela é ruim para a cidade, por esse aspecto. Por outro aspecto, ela pode, como estão dizendo, vir a se tornar um cartão postal da cidade. Pode, de alguma maneira, vir a aliviar o trânsito e isso pode ser benéfico.
Cidadania - Porém, Carlos Eduardo, num município de recursos escassos, uma obra que consome 250 milhões de reais, uma obra que consome tantos recursos... Ela está aí? Está aí, mas ela se torna um mau uso de recursos públicos. Não um uso desonesto, mas um uso ruim e incompetente, porque, sempre segundo a Folha, se uma obra "supérflua e cara" foi feita num município carente de recursos, seria dessa maneira. Na sua opinião, associar a imagem do patrono da Folha a uma obra supérflua, cara e que, por conseqüência, é ruim para São Paulo, não é um contrasenso?
Lins da Silva - Acho que essa é uma questão pessoal da família [Frias]. Mas, pessoalmente, eu acho que homenagens, em princípio, não se recusa, a menos que seja uma homenagem, assim, pornográfica. Eu não aceitaria, por exemplo, uma medalha do Pinochet. Eu não tenho uma opinião como ombudsman... Acho que essa é muito mais uma questão da família do que do jornal.
Cidadania - Um outro assunto. Numa entrevista que você deu à Folha no dia 20 de abril [pouco antes de assumir o cargo de ombudsman], você disse que a imprensa brasileira não perdeu a credibilidade, mas perdeu o poder de influenciar politicamente o povo...
Lins da Silva - Eu não disse que não consegue influir, mas que influi menos.
Cidadania - Ok, influi menos, exatamente. Influi menos politicamente. Você deu até o exemplo da eleição do presidente Lula, em que a mídia não conseguiu impedir a eleição do presidente, do que se pode entender que você admite que ela tentou impedir...
Lins da Silva - Eu não disse exatamente assim, eu disse que provavelmente, se a influência fosse maior, o presidente não seria reeleito.
Cidadania - Bem, provavelmente os proprietários da Folha, da Globo ou do Estadão não são, assim, exatamente simpáticos ao governo...
Lins da Silva - Eu não tenho como afirmar isso, peremptoriamente, porque eu não conheço...
Cidadania - Você não tem como afirmar... Você, vendo o viés de toda imprensa, você não vê que há, assim, uma animosidade em relação a este governo?
Lins da Silva - Eu acho que existe uma animosidade em relação ao governo Lula como havia contra o governo Fernando Henrique, contra o governo Itamar, contra o governo Collor...
Cidadania - A posição da Folha contra o governo Lula é igual à que ela tinha contra o governo Fernando Henrique?
Lins da Silva - É muito similar. Para dizer se é igual ou não é igual, teria que se fazer um estudo muito detalhado, porque é muito difícil você ter parâmetros de medição.
Cidadania - Há estudos sobre isso, não é? Há o estudo do Doxa / Iuperj...
Lins da Silva - Eu sou doutor em comunicação. A vida inteira eu me dediquei ao estudo da comunicação.
Cidadania - Mas você conhece esses estudos do Doxa?
Lins da Silva - Conheço.
Cidadania - Certo. Então...
Lins da Silva - Veja, eu acho que existe animosidade contra o governo Lula como eu acho que existia antes. Eu sou testemunha disso por ter trabalhado na Folha durante os governos Sarney e Fernando Henrique.
Cidadania - Confrontado com exemplos que mostrem claramente que o viés, a disposição da Folha de criticar o governo Lula, apesar de este governo estar obtendo resultados muito melhores para o Brasil do que o governo anterior, e se pudesse ser provado para você que a intensidade das críticas ao governo Fernando Henrique era muito menor do que é hoje, você se disporia a reconhecer que a Folha mudou de viés em relação a governos que tiveram resultados diferentes e, por isso, os tratamentos a eles deveriam ser inversos ao que são?
Lins da Silva - Seria preciso ver o estudo, a metodologia...
Cidadania - E, concordando com a metodologia, você assumiria isso publicamente, pois, como ombudsman, seria até sua obrigação. Mas você reafirma que a imprensa mantém a credibilidade, porém perdeu uma parte de sua influência...
Lins da Silva - ...Que eu acho que nunca nunca foi grande.
Cidadania - Nunca foi grande... Você acha que a imprensa, em outros momentos da vida nacional, não teve grande poder de influir nas decisões políticas do povo?
Lins da Silva - Eu digo que [esse poder] sempre foi menor do que as pessoas imaginam. Minha tese de doutorado tenta demonstrar isso e eu acho que demonstra com sucesso. Existe uma farta literatura que eu posso lhe passar.
Cidadania - Você acha que a mídia ajudou a eleger o Collor?
Lins da Silva - Alguma coisa, mas muito pouco. Meu estudo mostra isso.
Cidadania - E em que se baseia esse estudo?
Lins da Silva - Eu posso lhe mandar o estudo.
Optei por iniciar nossa reunião fazendo a ele uma exposição sobre quem era eu e quais eram meus motivos para estar ali. Falei do Movimento dos Sem Mídia, da manifestação do MSM diante da Folha no ano passado, da qual ele disse nunca ter tomado conhecimento, e falei, também, da representação que a ONG fez ao Ministério Público Federal. Finalmente, manifestei as críticas e indagações dos leitores deste blog e minha visão sobre a Folha e o resto da grande imprensa. Fui ouvido atentamente.
Por conta da honestidade intelectual que tanto prezo, sou obrigado a reconhecer que, apesar de várias teorias conspiratórias que surgiram, e as quais eu mesmo cheguei a considerar, não acredito que o convite que recebi de Lins da Silva tenha tido qualquer outra motivação além da que ele alegou.
Devido ao fato de que sou amador em termos de jornalismo, levei para a entrevista um pré-histórico gravador de fita cassete que pedi emprestado. O aparelho, arcaico, gravou em volume extremamente baixo nossa conversa, o que me gerou grande trabalho para fazer sua transcrição. Daí a demora em sair este post.
Reproduzo, a seguir, textualmente, a explicação que Lins da Silva me deu para a razão de seu convite. Antes, porém, explico que essa razão já me tinha sido explicada em e-mail que recebi dele há algumas semanas. Essa razão teria sido crítica que lhe fiz sobre sua atuação como mediador do programa Roda Viva, da TV Cultura, durante uma entrevista concedida pelo ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim.
Eis a explicação do ombudsman:
"Eu o convidei, primeiro, porque eu queria que você me mostrasse onde eu tinha sido parcial na condução da entrevista [com o ministro Celso Amorim] e também por ver uma possibilidade de diálogo que poderia ser enriquecedora para mim e, quem sabe, para você. A fita da entrevista está aqui [entregou-me a fita em DVD] e gostaria que você me apontasse onde eu fui parcial contra o ministro. Eu acho que eu não cometi isso. Eu conheço o ministro há muitos anos, temos uma excelente relação e dias antes, 72 horas antes do programa, ele estava em Washington, ele não tinha que estar em São Paulo aquele dia, ele veio especialmente para o programa. Eu acho, pela reação do ministro e de seus assessores ao fim do programa, que eu não fui parcial, que eu não fui antagônico ao ministro. Todo jornalista tem que ser duro nas perguntas com qualquer entrevistado, porque senão vira assessoria de imprensa, não é jornalismo. Eu acho que fiz algumas perguntas duras, mas eu acho que tentei manter a imparcialidade e coibi alguns ataques que eu achei que eram excessivos, que não deixavam que ele completasse seu raciocínio. Por isso, eu gostaria que você me mostrasse onde foi que eu errei e, se eu me convencesse, se eu vier a me convencer de que eu errei, vou pedir desculpas ao ministro e eu vou rever aquilo que eu fiz. De resto, sobre as observações que você me fez aqui, até agora, eu tenho muitos pontos de concordância e outros dos quais eu discordo. Agora, eu só queria deixar claro para você a minha disposição de ouvir, a minha disposição de pensar. Não sou petista, não sou antipetista, não sou de partido, como você também não é".
Como eu disse anteriormente, a impressão que tive da mediação de Lins da Silva naquele Roda Viva foi a de que ele não coibiu adequadamente as tentativas dos jornalistas ali presentes de impedirem Amorim de se manifestar com tranqüilidade. Não fosse assim, as interrupções, as tentativas de cassar a palavra do ministro, não teriam prosseguido até o último minuto do programa. Entretanto, por desencargo de consciência, obrigo-me a assistir ao DVD que Lins da Silva me entregou, a fim de especificar melhor minhas críticas à sua atuação como mediador daquele programa.
Após a explicação do ombudsman sobre o convite que me fez e sobre qual acredita ter sido sua postura no tal programa, entreguei a ele os comentários dos leitores deste blog e pedi que concedesse uma entrevista ao Cidadania.com, no que fui prontamente atendido. Abaixo, segue nossa conversa. Por enquanto, limitar-me-ei a reproduzir a entrevista. Os comentários sobre as opiniões de Lins da Silva, por enquanto deixo para vocês. Depois, em outro post, farei os meus comentários.
Eis a entrevista que gravei hoje com o ombudsman da Folha de São Paulo.
Cidadania - Eu gostaria de lhe fazer uma pergunta sobre a sua coluna do último domingo. É sobre a Ponte Estaiada, sobre a resposta dada pela redação da Folha de São Paulo sobre sua mudança de posição aparente em relação à obra, porque, em 2005, sobre a obra licitada pela prefeita Marta Suplicy, a Folha a considerou cara e supérflua. Hoje, a administração Gilberto Kassab deu à ponte o nome do patrono do jornal, o sr. Otávio Frias de Oliveira, e a Folha fez uma "belíssima" cobertura, com gráficos, falou sobre a solenidade, com a presença de parentes do sr. Frias, tudo muito bem, fez uma reportagem extensa, com explicações sobre tudo, mas, apesar de você dizer na sua coluna do último domingo que a Folha mantém sua opinião, e que seria descortês ela...
Lins da Silva - Eu não disse, a Folha disse.
Cidadania - Então, a Folha disse... A Folha alega que mantém a sua opinião sobre a obra, mas que não iria fazer uma desfeita ao poder público. Na verdade, esse "poder público" é um grupo político...
Lins da Silva - Não foi isso que disse a Folha, também.
Cidadania - Então vamos ver aqui, na sua coluna de domingo...
Lins da Silva - A Folha não disse que não iria fazer uma desfeita ao poder público. A Folha disse que o poder público iria fazer uma homenagem ao sr. Frias e que não seria o caso de não aceitar a homenagem.
Cidadania - O que você escreveu, Carlos Eduardo, foi o seguinte: "Seria descabido que a Folha e a família Frias rejeitassem uma homenagem ao seu líder". Essas são suas palavras textuais.
Lins da Silva - Minhas, não, da Folha.
Cidadania - Sim, da Folha, conforme você relatou. A explicação da redação, não é isso? Mas, enfim, é o seguinte: não seria o momento para que a Folha reafirmasse suas críticas à ponte na reportagem?
Lins da Silva - Sim, e você sabe que eu disse isso na coluna de domingo. Minha opinião é a de que a Folha deveria, na reportagem, ter feito a mesma observação [contra a ponte] que ela fez anteriormente [em 2005, quando o jornal elogiou a decisão de Serra de suspender a obra, apesar de que ela foi retomada e concluída].
Cidadania - Então você considera que realmente a Folha omitiu [na reportagem sobre a inauguração da ponte Estaiada] essa postura dela pretérita e não deveria ter feito isso.
Lins da Silva - Não, não deveria ter feito isso.
Cidadania - Você tem alguma idéia do por que a Folha fez isso?
Lins da Silva - Não, não tenho. Eu disse, em minha coluna, que a Folha recebeu 23 questionamentos [de leitores]. Mas a Folha não escreveu nenhum editorial dizendo que a ponte é boa, que a ponte foi barata, mas eu acho que a Folha deveria ter colocado na reportagem uma nota dizendo que continua achando que a ponte é supérflua e cara.
Cidadania - Você concorda com a premissa de que se a ponte é supérflua e cara, é uma obra ruim para São Paulo?
Lins da Silva - Não necessariamente. Duas coisas: primeiro, a ponte está pronta. Eu não estou falando em nome da Folha, é minha opinião pessoal. Não teria cabimento pedir que se derrubasse a ponte. Segundo, eu acho que, em princípio, se ela é supérflua e cara, ela é ruim para a cidade, por esse aspecto. Por outro aspecto, ela pode, como estão dizendo, vir a se tornar um cartão postal da cidade. Pode, de alguma maneira, vir a aliviar o trânsito e isso pode ser benéfico.
Cidadania - Porém, Carlos Eduardo, num município de recursos escassos, uma obra que consome 250 milhões de reais, uma obra que consome tantos recursos... Ela está aí? Está aí, mas ela se torna um mau uso de recursos públicos. Não um uso desonesto, mas um uso ruim e incompetente, porque, sempre segundo a Folha, se uma obra "supérflua e cara" foi feita num município carente de recursos, seria dessa maneira. Na sua opinião, associar a imagem do patrono da Folha a uma obra supérflua, cara e que, por conseqüência, é ruim para São Paulo, não é um contrasenso?
Lins da Silva - Acho que essa é uma questão pessoal da família [Frias]. Mas, pessoalmente, eu acho que homenagens, em princípio, não se recusa, a menos que seja uma homenagem, assim, pornográfica. Eu não aceitaria, por exemplo, uma medalha do Pinochet. Eu não tenho uma opinião como ombudsman... Acho que essa é muito mais uma questão da família do que do jornal.
Cidadania - Um outro assunto. Numa entrevista que você deu à Folha no dia 20 de abril [pouco antes de assumir o cargo de ombudsman], você disse que a imprensa brasileira não perdeu a credibilidade, mas perdeu o poder de influenciar politicamente o povo...
Lins da Silva - Eu não disse que não consegue influir, mas que influi menos.
Cidadania - Ok, influi menos, exatamente. Influi menos politicamente. Você deu até o exemplo da eleição do presidente Lula, em que a mídia não conseguiu impedir a eleição do presidente, do que se pode entender que você admite que ela tentou impedir...
Lins da Silva - Eu não disse exatamente assim, eu disse que provavelmente, se a influência fosse maior, o presidente não seria reeleito.
Cidadania - Bem, provavelmente os proprietários da Folha, da Globo ou do Estadão não são, assim, exatamente simpáticos ao governo...
Lins da Silva - Eu não tenho como afirmar isso, peremptoriamente, porque eu não conheço...
Cidadania - Você não tem como afirmar... Você, vendo o viés de toda imprensa, você não vê que há, assim, uma animosidade em relação a este governo?
Lins da Silva - Eu acho que existe uma animosidade em relação ao governo Lula como havia contra o governo Fernando Henrique, contra o governo Itamar, contra o governo Collor...
Cidadania - A posição da Folha contra o governo Lula é igual à que ela tinha contra o governo Fernando Henrique?
Lins da Silva - É muito similar. Para dizer se é igual ou não é igual, teria que se fazer um estudo muito detalhado, porque é muito difícil você ter parâmetros de medição.
Cidadania - Há estudos sobre isso, não é? Há o estudo do Doxa / Iuperj...
Lins da Silva - Eu sou doutor em comunicação. A vida inteira eu me dediquei ao estudo da comunicação.
Cidadania - Mas você conhece esses estudos do Doxa?
Lins da Silva - Conheço.
Cidadania - Certo. Então...
Lins da Silva - Veja, eu acho que existe animosidade contra o governo Lula como eu acho que existia antes. Eu sou testemunha disso por ter trabalhado na Folha durante os governos Sarney e Fernando Henrique.
Cidadania - Confrontado com exemplos que mostrem claramente que o viés, a disposição da Folha de criticar o governo Lula, apesar de este governo estar obtendo resultados muito melhores para o Brasil do que o governo anterior, e se pudesse ser provado para você que a intensidade das críticas ao governo Fernando Henrique era muito menor do que é hoje, você se disporia a reconhecer que a Folha mudou de viés em relação a governos que tiveram resultados diferentes e, por isso, os tratamentos a eles deveriam ser inversos ao que são?
Lins da Silva - Seria preciso ver o estudo, a metodologia...
Cidadania - E, concordando com a metodologia, você assumiria isso publicamente, pois, como ombudsman, seria até sua obrigação. Mas você reafirma que a imprensa mantém a credibilidade, porém perdeu uma parte de sua influência...
Lins da Silva - ...Que eu acho que nunca nunca foi grande.
Cidadania - Nunca foi grande... Você acha que a imprensa, em outros momentos da vida nacional, não teve grande poder de influir nas decisões políticas do povo?
Lins da Silva - Eu digo que [esse poder] sempre foi menor do que as pessoas imaginam. Minha tese de doutorado tenta demonstrar isso e eu acho que demonstra com sucesso. Existe uma farta literatura que eu posso lhe passar.
Cidadania - Você acha que a mídia ajudou a eleger o Collor?
Lins da Silva - Alguma coisa, mas muito pouco. Meu estudo mostra isso.
Cidadania - E em que se baseia esse estudo?
Lins da Silva - Eu posso lhe mandar o estudo.
Escrito por Eduardo Guimarães às 23h39
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